Ônus dos Custos do Teletrabalho

A Lei 13.467/2017 inseriu um capítulo destinado a regulamentar o teletrabalho (capítulo II-A) na Consolidação das Leis do Trabalho. A normatização foi feita nos artigos 75-A, 75-B, 75-C, 75-D, 75-E e, ainda, no artigo 611-A, VIII, da CLT

DIREITO DO TRABALHO

Ana Paula Muniz Neves

6/24/20229 min read

Com o advento de novas tecnologias, mudanças foram acontecendo no mundo do trabalho e novas formas puderam ser criadas. A mais recente que tivemos, foi a do trabalho a distância (home office), que ganhou contornos peculiares a partir de começo de 2020, com a disseminação da pandemia do coronavírus (COVID-19), de modo que, já não se enxerga o trabalho sendo desenvolvido somente nas dependências da empresa, o trabalho assume outras feições e características que relativizam a ideia de hipossuficiência que rotula o trabalhador empregado. Nesse atual cenário, para que se estabeleça a relação de emprego, é irrelevante o local da prestação de serviços pelo empregado, que pode ser realizado até mesmo na residência deste. Neste caso, intitulou-se home office, o trabalho feito à distância, pelo fato de a prestação de serviços ocorrer fora do estabelecimento empresarial, sendo certo que a Lei n. 12.551/2001, alterando o art. 6º da CLT, deixou clara a possibilidade de natureza empregatícia dessa relação jurídica. Em 2017 a Lei n. 13.467/2017 – “Reforma Trabalhista” inseriu um capítulo destinado a regulamentar o teletrabalho Capítulo II-A na Consolidação das Leis do Trabalho. A normatização foi feita nos artigos 75-A, 75-B, 75-C, 75-D, 75-E e, ainda, no artigo 611-A, VIII, da CLT, nos seguintes termos: os artigos 75-A a 75-E,

DO TELETRABALHO

Art. 75-A. A prestação de serviços pelo empregado em regime de teletrabalho observará o disposto neste Capítulo.’

Art. 75-B. Considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.

Parágrafo único. O comparecimento às dependências do empregador para a realização de atividades específicas que exijam a presença do empregado no estabelecimento não descaracteriza o regime de teletrabalho.

Art. 75-C. A prestação de serviços na modalidade de teletrabalho deverá constar expressamente do contrato individual de trabalho, que especificará as atividades que serão realizadas pelo empregado.

§ 1º Poderá ser realizada a alteração entre regime presencial e de teletrabalho desde que haja mútuo acordo entre as partes, registrado em aditivo contratual.

§ 2º Poderá ser realizada a alteração do regime de teletrabalho para o presencial por determinação do empregador, garantido

prazo de transição mínimo de quinze dias, com correspondente registro em aditivo contratual.

Art. 75-D. As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito.

Parágrafo único. As utilidades mencionadas no caput deste artigo não integram a remuneração do empregado.

Art. 75-E. O empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho.

Parágrafo único. O empregado deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador.

Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre: VIII - teletrabalho, regime de sobreaviso, e trabalho intermitente Já em 2020 com a situação da pandemia instaurada e diante da gravidade do quadro, foi reconhecido o estado de calamidade pública, com período inicial até 31/12/2020. A Medida Provisória n. 927/2020, cuja validade encerrou-se no dia 19/07/2020, “caducou”, em virtude de ausência de apreciação pelo Senado Federal, tratava de medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do Covid-19. Entre tais medidas adotadas a época, além da antecipação das férias, aproveitamento e antecipação de feriados, previu, também, a adoção do regime do teletrabalho. O isolamento social devido a pandemia do coronavírus fez com que as empresas buscassem alternativas urgentes para não parar as atividades completamente. Foi nesse contexto, que o home office e o teletrabalho se firmaram como alternativas ao regime de trabalho presencial em 2020. Entretanto, muito embora o teletrabalho e o home office possam ser desempenhados a partir de casa, ou outro local fora da empresa, eles não são a mesma coisa. O que gera muita confusão na cabeça dos empregados/colaboradores e até mesmo dos empresários. Antes de se falar sobre o ônus do trabalho a distância ou do teletrabalho, se faz necessário diferencia-los.

O que é o teletrabalho?

O teletrabalho foi introduzido pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467 de 2017) sendo assim, o artigo 75-B estabelece que:

Art. 75-B. Considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.

Parágrafo único. O comparecimento às dependências do empregador para a realização de atividades específicas que exijam a presença do empregado no estabelecimento não descaracteriza o regime de teletrabalho. Portanto, com base na norma jurídica, considera-se teletrabalho uma espécie de trabalho a distância porque, requer um item específico para sua configuração, qual seja, o uso, o emprego de tecnologias de informação e comunicação pelo empregado para o desenvolvimento laboral.

Nesta modalidade de trabalho temos um ponto positivo, os empregados/colaboradores que estão submetidos a esse regime não têm controle de jornada. Conferindo a eles uma certa liberdade e maior autonomia, para gerir e personalizar sua rotina laboral. Porém, como existe isenção de controle de jornada, não há pagamento de horas extras e adicionais noturno. Com o bônus também vem o ônus, e a liberdade laboral tem seus custos, dosada com alguns pontos negativos.

TRT-PR-12-06-2015 TELETRABALHO. CONFIGURAÇÃO. Com a implementação de novas tecnologias, mormente nas áreas da informática e telecomunicações, surgiram outras formas de trabalho, que não exigem o comparecimento diário do empregado na empresa, dentre elas o teletrabalho. Conquanto o art. 6º da CLT se refira ao trabalho "executado no domicílio do empregado", o teletrabalho pode ocorrer em outros locais, como em telecentros ou sem um local fixo e certo, sem o contado direto, pessoal e contínuo com o empregador. O teletrabalho difere do trabalho externo, por ser desenvolvido mediante o emprego de modernas tecnologias de informática e telecomunicações. Assim, comprovado o trabalho externo, consistente no atendimento a clientes da empregadora, e não o teletrabalho, não são devidas horas extras oriundas desta última modalidade de prestação de serviços. Recurso ordinário do autor não provido. TRT-PR-05723-2014-015-09-00-9-ACO-18567-2015 - 4A. TURMA Relator: CÉLIO HORST WALDRAFF Publicado no DEJT em 12-06-2015

Outro ponto positivo, é a necessidade legal de assinatura de um termo de responsabilidade, no qual o empregado/colaborador se compromete a seguir as regras e instruções fornecidas pelo empregador.

O que é home office?

Sem delongas, o home office é o regime de trabalho convencional executado em casa, no conforto do lar.

Entende-se por home office uma situação” pontual” e não permanente, que perdure por muito tempo, toma-se como exemplo, a atividade ser desenvolvida a distância, durante o período da vigência do decreto na pandemia do Coronavírus, mesmo que, exista uma certa regularidade para que o trabalhador preste serviços de sua casa.

Outro exemplo, seria no caso em que uma empresa adotasse um regime de rodízio entre departamentos ou modelo híbrido de trabalho com os seus colaboradores/empregados, no qual é adotado 3 dias de trabalho em casa e 2 dias de trabalho na empresa.

Desse modo, ao adotar este formato, não é necessário nenhum tipo de formalização ou mesmo alterações no contrato de trabalho para a prestação do serviço na forma de home office.

No home office, diferentemente do teletrabalho, é necessário registrar a jornada de trabalho como se na empresa estivesse laborando.

Assim, pode-se concluir que, o home office é uma extensão da empresa em casa, com a possibilidade de variar os locais de trabalho. Qual a diferença do teletrabalho e do home office? A diferenciação está na regulamentação da primeira modalidade de trabalho. O teletrabalho é fundamentado em lei, já o home office não. Portanto, as regras que se aplicam ao teletrabalho não se aplica ao home office. Se fazendo necessário, a leitura atenta da lei no que tange ao teletrabalho. Como já dito anteriormente o home office é uma modalidade de trabalho desempenhada como se na empresa fosse, portanto, não muda nada em relação ao trabalho presencial, utiliza-se as mesmas regras. Sendo assim, uma das obrigações da empresa é fornecer o mesmo ambiente de trabalho que existe dentro da empresa, para desempenho das atividades.

Já o teletrabalho, por sua vez, precisa ser legalmente registrado em contrato, estabelecendo as responsabilidades do empregado/colaborador para com a empresa. Uma vez que não é regida por controle de horário, e sim por demanda.

Pontos em comum entre o teletrabalho e home office

O primeiro ponto a destacar, é que ambas as modalidades de trabalho são realizadas em ambiente doméstico, normalmente em casa, mesmo que o home office possa ser desenvolvido de forma parcial.

Outro ponto importantíssimo, é que o empregador é responsável por fornecer toda a tecnologia e infraestrutura necessária para o desenvolvimento das tarefas diárias. Quer sejam computadores ou mesmo internet de velocidade e estabilidade adequadas, isso é de responsabilidade da empresa.

Ônus dos custos do teletrabalho ou home office

Como já visto o trabalho à distância, normalmente realizado no ambiente doméstico do próprio empregado/colaborador, vem ganhando expressividade no meio empresarial como forma de imprimir maior competitividade ao negócio, com redução de custos com instalações como: aluguel, construção e manutenção, e insumos: água, energia elétrica, internet, com deslocamento de empregados (vale-transporte, vale combustível), muitas vezes também, supostamente a redução a sujeição à ação de órgãos estatais de controle, como a auditoria-fiscal do trabalho.

Acompanhando a tendência do mercado de trabalho, a reforma trabalhista, regulamentada pela Lei no 13.467/2017, introduziu mecanismos de defesa aos empresários, instituindo o bolso do empregado/colaborador como alvo de redução de custos empresariais. Norma está, inserida sutilmente no artigo 75-D, deste dispositivo da CLT:

Art. 75-D. As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito. (grifo meu)

O artigo supracitado contextualiza a possibilidade da responsabilidade pelas custas de instalação e manutenção do trabalho remoto seja flexibilizado, entendendo ser transferida para o empregado/colaborador, inclusive como provável requisito para sua contratação.

Trata-se de disposição que propicia evidente desequilíbrio da harmonia entre os princípios constitucionais da livre iniciativa e do trabalho, ao atender exclusivamente a necessidades empresariais.

Este artigo da CLT não pode ser aplicado em desarmonia com o princípio da alteridade positivado na própria Consolidação, segundo o qual o trabalho deve ser executado por conta e risco exclusivo do empregador (art. 2o, caput).

Portanto, não cabe ao contrato de trabalho previsto pelo art. 75-D prever que o empregado custeie, parcial ou totalmente, o trabalho remoto, seja no ato de sua contratação ou durante o período contratual, sob pena de nulidade dessa pactuação (CLT, arts. 9º e 444).

Destarte, se faz necessário a compreensão de que o simples fato de a prestação de serviços ocorrer fora das dependências do empregador não pode transferir ao empregado, parte hipossuficiente da relação empregatícia e que somente detém a força de trabalho, os custos da prestação de serviço. De modo que, no teletrabalho, o ambiente de trabalho estende-se para o local em que o empregado efetivamente labora, mesmo que o local de trabalho seja diverso do local que outrora laborava.

A análise dos dispositivos celetista em questão, não pode ser feita de forma isolada, mas dentro do contexto do tempo e modelo em que estão inseridos. Destaca-se em particular, o artigo 2º da CLT, caput, mantido pela reforma, o qual, estabelece que empregador é justamente aquela que admite, assalaria, dirige a prestação pessoal dos serviços e assume os riscos da atividade econômica. Dessa feita, a interpretação sistêmica do ordenamento jurídico leva à conclusão de que, mesmo na modalidade de teletrabalho, o empregador é o único responsável pelos custos do empreendimento, em observância ao princípio da alteridade que rege as relações empregatícias.

Portanto, em detrimento ao artigo acima exposto, a interpretação do artigo 75-D não deve ser feita no sentido mais amplo, de modo que o contrato escrito possa estabelecer, por exemplo, a forma de custeio pelo empregador dos equipamentos e da infraestrutura necessários a atividade laboral, bem como, a forma de reembolso das despesas eventualmente feitas pelo empregado, mas, de forma alguma, pode significar a transferência dos ônus do empreendimento para o empregado/colaborador.

Tanto no teletrabalho quando no home office é indicado, porém, não obrigatório, que as empresas cubram os custos decorrentes do trabalho exercidos no ambiente doméstico (casa) dos empregados/colaboradores.

Computam-se como gastos, todos aqueles inerentes e necessários ao desempenho laboral, como se na empresa fossem realizados, tais como: energia elétrica, internet na forma da instalação ou aumento da banda e quaisquer outros itens necessários as atividades.

Da mesma forma que alguns custos novos são introduzidos, outros podem ser suspensos, como o exemplo, o uso do vale-transporte ou auxílio de combustível.

Recomenda-se da mesma forma, manter o vale-refeição e o vale-alimentação, já que o profissional passará a se alimentar em casa e esse custo é o mesmo do formato presencial, já absorvido pela empresa.

É sempre bom o empresário estar atento as necessidades do empregado/colaborador, no intuito de ouvir o que eles têm a dizer. Dessa forma, possíveis cortes não terão impacto negativo no clima organizacional da empresa, tornando o trabalho mais produtivo, sendo no formato presencial, no teletrabalho ou no home office.

Referências:

FERNANDES, Fabiana Santalucia. O trabalho em domicílio e o teletrabalho como formas de manifestação do trabalho à distância na atualidade. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/28028/o-trabalho-em-domicilio-e-o-teletrabalho-como-formas-de-manifestacao-do-trabalho-a-distancia-na-atualidade>. Acesso em: 22/06/2022.

BRASIL, Planalto, Lei no 13.467/2017. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm>. Acesso em 22/06/2022.